Daslan Melo Lima
Madrugada de 25/06/1955, salão do teatro do Hotel Quitandinha, Rio de Janeiro, final do concurso para a escolha da Miss Brasil 1955, evento promovido pelos Diários e Emissoras Associados, em colaboração com a Distribuidora Brasileira de Filmes, por delegação do Miss Universe Beauty Pageant Inc. e sob os auspícios dos Laboratórios Leite de Rosas, Indústria de Bebidas Cinzano, Companhia América Fabril, maiôs Catalina, Companhia de Fiação e Tecidos Corcovado e Hotel Quitandinha.
Um numeroso público e dezenove moças de vários Estados brasileiros aguardavam o anúncio daquela que iria receber o título máximo da beleza brasileira das mãos da baiana Martha Rocha, Miss Brasil e vice-Miss Universo 1954. As 15 personalidade do júri elegeram Emília Barreto Corrêa Lima, Miss Ceará, para o primeiro lugar, com oito pontos. No segundo lugar, empatadas com dois pontos ficaram Annete Stone, Miss Amazonas; Ingrid Schmidt, Miss Rio de Janeiro; e Ethel Chiaroni, Miss São Paulo. No terceiro Lugar, Gilda Medeiros, Miss Pará, com um ponto, a quem esta Sessão Nostalgia é dedicada.
As cinco finalistas do Miss Brasil 1955, da esquerda para a direita: Miss Amazonas, Annete Stone; Emília Corrêa Lima, Miss Ceará; Ethel Chiaroni, Miss São Paulo;Ingrid Schmidt,Miss Rio de janeiro; e Gilda Medeiros, Miss Pará. (Foto O CRUZEIRO,09/07/1955)
Gilda Medeiros, em traje de gala (foto O Cruzeiro), usando maiô Catalina (foto Manchete) e na capa de O Cruzeiro.
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OLHOS DE ÍNDIA MOURISCA - GILDA, A MULHER EXÓTICA - Reportagem de Álvares da Silva e fotos de Indalécio Wanderley, transcrita da revista O CRUZEIRO, de 30/07/1955, obedecendo à forma original das regras ortográficas da época.
.....Gilda Medeiros – Maria Gilda Rodrigues de Medeiros, morena, de 20 anos, com 1,74m de altura – Miss Pará, 3ª colocada no concurso de Miss Brasil 1955, é o tipo racial mais exótico, mais curioso, das 5 finalistas. Quando desfilava em Quitandinha, perante o júri final, um cavalheiro gritou-lhe, entre galanteador e irônico: “Esta pequena é toda a Bienal!” – com isso querendo dizer-lhe que, pela leve angulosidade de rosto e corpo, ela era um monumento vivo à arte moderna. Gilda é uma rara mescla de índia e mourisca, com escalas ancestrais em Portugal, Maranhão e Xingu. Nascida em Belém do Pará, em 20 de maio de 1935, é filha do próspero comerciante luso Sr. Ilídio Alves de Medeiros, originário de Vila Real de Trás-os-Montes, mas cujo tetravô era mouro; e de Celínia Rodrigues de Medeiros, descendente de seringueiros maranhenses, que se fixaram no Pará, mas cuja bisavó era índia pura do Alto Xingu. A família do lado materno ainda hoje possui vastos seringais no Rio Cajari (Pará), produzindo borracha. “Esses seringais” – diz Gilda gracejando – “com a morte de minha avó, vão procurar duas lutas: uma, na justiça, para saber quais as partes dos herdeiros, que a família é muito grande; e a outra, a ferro e fogo, pois, com a morte de meu tio-avô, que era o coronel-administrador, os caboclos-meeiros apossaram-se dos seringais, passaram a agir por conta própria, e dizem que receberão os novos donos a bala.” O pai de Miss Pará é um português muito alto (1,84m), campeão de remo pelo clube Tuna Luso Comercial, com o apelido de “Braço de Pau”. Emigrou da santa terrinha para Belém com 12 anos, para ser empregadinho dos armazéns”Boa Fama” (modas e armarinhos); hoje é chefe da firma, e ainda possui a Casa Bangu (tecidos).
.....Gilda, filha mais velha, tem uma linda irmâ de 13 anos, Maria Nilda, e uma irmã adotiva, a prima Celínia. Foi criada como se fôsse menino, vestida de “short”, jogando futebol nas peladas, levando caneladas. “Nada de goleira. Jogava na linha” – diz Gilda. – “Enfrentava a meninada. Uns 30 garotos de rua. A única menina era eu.” Dessa infância ao ar livre, ficou-lhe uma personalidade marcante. É uma vocação de líder, uma Maria Quitéria ainda por se revelar. “Minha filha” – informa D. Celínia – “nas brincadeiras de criança, era sempre a chefe, a mãe, a professora. Punha as empregadas alucinadas, quando iam buscá-la no Colégio Santo Antônio das Irmãs Dorotéias. Corria, deixava-as para trás. Um dia, a passeio aqui no Rio, menina ainda, atravessou correndo a praia do Flamengo na hora do “rush” das 5 horas, e deixou a família em polvorosa. Certa vez subiu ao telhado do sobrado em que morávamos para empinar papagaio. Ficou presa lá em cima, foi preciso mandar retirá-la. Seu divertimento favorito era passar de janela para janela, pelo lado de fora. “ Gilda admira esportes violentos: hóqueis-em-patins, pugilismo, basquete. Pratica tênis, natação, gôlfe. Em futebol, torce como louca, dá berros incríveis. É Flamengo. No cinema, torce da mesma maneira em filme de “far-west”, e uma vez quebrou a cadeira. Sabe inglês. Tem curso de canto lírico. Admira Shakespeare, Hemingway, Dinah Silveira, Rachel de Queiroz, Làsinha Luis Carlos. Parece-se muito com a atriz italiana Lúcia Bosé, e admira touradas. Vai fazer teste para o cinema nacional. É boa cozinheira. Pratos favoritos: português, bacalhau cozido; paraense, pato ao tucupi (beberagem de mandioca); e italiano, “spaghetti” ao burro. No dia em que foi eleita Miss Pará, a família celebrou com 18 garrafas de champanha (champanha português Assis Brasil). Gosta de Emília, Miss Brasil, e deseja que seja Miss Universo.
.....Já estêve 2 vezes na Europa. E vai voltar, logo que puder. Conhece Portugal, Espanha, França, Itália, Suiça e Alemanha. Adora Portugal e Itália. “Gosto de tudo o que é quinquilharia. E a Itália é cheia de quinquilharia. Fui a Roma e não vi o Papa. Preciso voltar, para vê-lo. Lisboa é uma maravilha. Sou fã ardorosa, frenética de touradas. A tourada portuguêsa é superior à espanhola. O toureiro luso não mata o touro, porém dá mais colorido à arte. Vi touradas em Lisboa e Madri. Torci muito. Como também torci de ficar rouca pelo time de hóquei-em-patins português “Pau-d’Arcos”. Na Europa, julgavam-me espanhola ou italiana, nunca brasileira. Uma noite, na Rivera Italiana, em San Remo, pedi à orquestra que tocasse o Tico-Tico no Fubá. O pessoal que estava no café, cujo nome me esqueço, era um desfile internacional. Comecei a dançar, acabei no palco, fazendo uma exibição, com os americanos malucos de entusiasmo, aplaudindo e pedindo mais. Em Portugal, pediram-me autógrafo, pensando que eu fosse a atriz italiana Lúcia Bosé. Mas não pretendo me casar com toureiro. (Esclarecimento: Lúcia Bosé é casada com Dominguin.)
.....Quando menina, falava em me casar e ter 12 filhos. À mesa, na hora das refeições, queria meia dúzia de filhos de um lado e de outro, com meu marido a uma cabeceira, e eu à outra. Hoje deixei de ser patriarcal com a alta do custo de vida. Quero casar e ter 2 filhos, educá-los bem. Não perco filme de “far-west” com Gary Cooper e torço horrivelmente. No cinema, meus favoritos são: no cinema alemão, Dieter Bosch e Maria Schell; no francês, Dant Robin e Jean Marais; no inglês, Stewart Granger e Jean Simmons: no italiano, Silvana Pampanini, Massimo Girotti e Raf Valone; no americano, Rock Hudson, Marlon Brando, Montgomery Clift, Joan Crawford, Bette Davis e Audrey Hepburn. O melhor filme que já vi em minha vida é um sueco, “A ´Última Felicidade”. Se acaso viesse a fazer teatro, gostaria de viver o papel da aia de Julieta, na peça de Shakespeare. Estou esperando ansiosa a oportunidade de ir aos Estados Unidos. Quero visitar a parte central, o Grad Canyon, a região linda do deserto americano.” Opinião sobre Paris? “Esperava mais da França. Confesso: desde que estive em Paris, considero a mulher brasileira a mais elegante.” Visitou o Louvre. Tela favorita: “Coração da Imperatriz Josefina”. Esqueceu o nome do pintor. “Parece cinema em 3-D.” Detesta arte moderna, contudo gosta de Renoir. Dá uma gargalhada ferina, exibindo seus bons e miúdos dentes marajoaras; “A Vênus de Milo é um monstro! Se alguém, por acaso, me dissesse que tenho o corpo parecido com a daquela senhora, eu me consideraria insultada”.
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GILDA REINA EM MARAJÓ – Reportagem de Fausto Wolff e fotos de Ivo Barreti, transcrita da revista MANCHETE, de 20/02/1960, obedecendo à forma original das regras ortográficas da época.
Gilda passeia 1,75 de elegância e beleza nas portas da selva amazônica.Nas grandes manadas de búfalos negros está a principal riqueza da ilha.
.....Trazendo no olhar uma tristeza eterna, os búfalos negros de chifres virados, naquela tarde, na Ilha de Marajó, andavam uns atrás dos outros, por um vasto descampado, até serem recolhidos ao curral. Encostada na cêrca, uma beleza morena, entre alheia e presente aos encantos da ilha, jogava maciamente sobre os ombros as pontas sedosas dos seus cabelos pretos. Gilda Medeiros, a rainha do Marajó, manequim das mais famosas casas de moda do Rio e também internacional, com os olhos grandes e bonitos sôbre as planuras da sua ilha, diz:
- No Pará posso ser eu mesma, longe da vida fútil que um modêlo tem de levar, embora goste muito de viver no Rio.
.....Com a selva amazônica como cenário e rodeada por crianças magras, filhas dos paupérrimos vaqueiros de Marajó, Gilda fala de seus planos, entre um e outro sorriso:
.....- No terreno amoroso nada de novo. Pretendo estudar arte dramática, línguas e literatura. Este ano atenderei apenas a alguns compromissos, mas pretendo passar a maior parte do tempo na minha terra. Aqui assino uma coluna social e talvez até me candidate a deputada. Atualmente, em Belém, mulher na política é bossa nova. E desejo estar em dia com a época.
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GILDA MEDEIROS, A ATRIZ E A MODELO
Gilda Medeiros atuou em sete filmes, sendo Riacho do Sangue, dirigido em 1966 por Fernando Barros, o mais elogiado e premiado, e que lhe rendeu o prêmio de Melhor Atriz Coadjuvante do Festival de Passa Quatro. Desfilou para os maiores estilistas brasileiros, numa época em que esse termo era conhecido como costureiro ou figurinista. Atuou como apresentadora de programas na televisão e fez inúmeros comerciais. Detalhe: sua irmã Nilda Medeiros, Miss Pará 1963, obteve o sétimo lugar no Miss Brasil 1963, concurso vencido pela gaúcha Ieda Maria Vargas.
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Gilda Medeiros é uma personalidade de grande prestígio no Estado do Para e há anos assina uma coluna no jornal O LIBERAL, um dos mais importante veículos de comunicação do Estado.
Gilda Medeiros, um ícone do Pará.(Foto: diarioonline.com.br, 15/12/2011)
Assisti recentemente no Youtube uma entrevista de Gilda Medeiros na Sala Vip, programa da televisão paraense de Gil Reis, de 07/01/2012. Ela continua bela, elegante, inteligente e bem-humorada. Entre as coisas que falou, recordou que fez parte do primeiro quadro permanente de modelos da Socila, conhecido como As 12 Garotas de Ouro, e que desfilou até a idade de 42 anos. A propósito de plásticas, não teve dúvida alguma em afirmar que era contra e que devemos envelhecer com o rosto que Deus nos deu. Fiquei atento para as perguntas do entrevistador sobre o seu reinado como Miss Pará 1955. Mas ele não fez nenhuma, talvez por entender que não precisaria, pois um título de Miss é para sempre e quem foi rainha nunca perde a majestade.
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Para conferir a entrevista de Gilda Medeiros no Sala Vip, de Gil Reis, clique nos links a seguir.
Primeira parte,
Segunda parte,
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Bela homenagem prestada pela Sessão Nostalgia a Gilda Medeiros, a mais famosa Mss Pará de todos os tempos. E como tantas outras beldades do passado, continua fiel ao rosto de origem que a consagrou um ícone da mulher do norte.
ResponderExcluirabraços,
muciolo ferreira
Acredito que esta matéria sobre Gilda Medeiros será lida e elogiada por milhares de paraenses.
ResponderExcluirGilda é um orgulho do Pará! Um nome que nos deu muitas alegrias.
Daslan, parabéns por resgatar para o mundo da Internet o passado de glória de Gilda Medeiros.
Marcos Ribeiro
Belém do Pará
Linda, educada, fina, uma verdadeira princesa!
ResponderExcluirUm beijo enorme pra você,querida Gilda Medeiros!
Daslan, tu me conheces. Gostaria que você fizesse uma matéria sobre uma Miss para de sobrenome Ohana. Creio que foi Miss Santarém, cidade onde moro. Forte abraço, Rubens Elias
ResponderExcluirRecado para Rubens Elias:
ResponderExcluirSônia Maria Ohana já foi homenageada na SESSÃO NOSTALGIA.
Confira este link
http://passarelacultural.blogspot.com.br/2010/06/sessao-nostalgia-smo-miss-196.html
Sou Zilda Medeiros filha de Graziella Medeiros prima filha de Alzira Medeiros irmã do Tio José pai da Mena Medeiros. Muito feliz por achar essa história
ResponderExcluirOlá Zilda, meu nome é Patrícia Medeiros, sou irmã de Gilda Medeiros e filha do Ilídio Medeiros em seu 2o casamento. Creio que somos primas distantes,n conheci e convivi com tia Alzira e Maria Rosa, talvez Graziella se lembre de mim. Bjsss
ExcluirOlá Zilda, meu nome é Patrícia Medeiros, sou irmã de Gilda Medeiros e filha do Ilídio Medeiros em seu 2o casamento. Creio que somos primas distantes,n conheci e convivi com tia Alzira e Maria Rosa, talvez Graziella se lembre de mim. Bjsss
ExcluirOlá meu nome é Andréa, sou filha da Maria que trabalhou na casa da mãe da Gilda, eu ia muito pequena para casa dela, eu olhava aquela mulher achava tão linda, um dia tive o prazer de encontrar a Gilda passeando pela Presidente Vargas em Belém e parei para falar com ela, como sempre muito educada, conversou comigo, nossa ela é uma pessoa maravilhosa e cuidou muito bem de nós e da minha mãe quando trabalhou na casa delas.
ResponderExcluirSou nora da Gilda Medeiros, ela atualmente mora em Bento Gonçalves nas Serras Gaúchas. Ela está com Alzheimer mas ainda é muito feliz. Pretendemos trazê-la para Fortaleza assim que a pandemia acabar.Linda homenagem. Obrigada
ResponderExcluirMeus sentimentos a família pela perda irreparável.Gilda fez juz ao nome,foi uma mulher incrível.Muita luz p ela.
ResponderExcluirGilda Medeiros faleceu no dia 25 de junho de 2021.
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Vide:
https://www.oliberal.com/belem/gilda-medeiros-morre-aos-86-anos-em-fortaleza-ce-nesta-sexta-25-1.403098
olá, gostaria muito falar com a nora da Gilda Medeiros, sou o Jose Antonio amigo de infancia do Felipe medeiros, quando ele morava aqui em copacabana no ano de 1968, gostaria de ter o contato do Felipe
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