AQUELA MARIA
Daslan Melo Lima
Festa no Morro da Conceição, no bairro de Casa Amarela, Recife. Festa no bairro de Mocós, em Timbaúba. Dia de Oxum, orixá feminina das religiões afro-brasileiras. Estas celebrações levam minh’alma aos versos de Flor D’Água, uma linda música gravada há anos pela Banda de Pau e Corda.
“Maria tomando banho / nas águas claras do rio. / Seu corpo jovem moreno / não sente o rigor do frio.
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Boiando a flor d'água vai / embalando os sonhos seus / e eu olhando alimentando / os sonhos que são bem meus. /// Hei de casar com Maria / na Festa da Padroeira, / deixar morrendo de inveja / as moças namoradeiras. /// Já vejo o corpo moreno / de rendas brancas vestido / e botões de laranjeira / pondo o cabelo florido. /// Maria, minha Maria, / vou dar-te tudo que tenho, / meus canaviais tão lindos, / minha senhora de engenho. /// Hei de casar com Maria / na Festa da Padroeira, / deixar morrendo de inveja / as moças namoradeiras.”
Estava escrito que não tinha que ser. O destino sepultou rendas brancas, botões de laranjeiras e fantasias. Não casei com aquela Maria na Festa da Padroeira, mas ganhei a simpatia dos sonhos seus. Estava escrito que não tinha que ser e não deixei morrendo de inveja as moças namoradeiras, mas ganhei a fidelidade dos sonhos meus.
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Timbaúba-PE, no oitavo dia do último mês de dezembro de 2012.
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É DEZEMBRO OUTRA VEZ
Daslan Melo Lima
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Muitas vezes, tenho a impressão de que os movimentos de rotação e translação do nosso Planeta Terra estão muito rápidos. O que fazer diante dos mistérios da vida e da morte? Ter fé em DEUS, relaxar e dar a nossa parcela de contribuição para construir um mundo melhor.
Durante a maior parte do ano, meu pé de acácias amarelas se comporta com a maior discrição. Mas quando chega esta época, ele se desnuda sem pudor. Livra-se das folhas secas que até pouco tempo eram verdes e se veste generosamente de ouro.
Quantas lições a minha árvore de ouro ensina? Inúmeras. É com ela que minh'alma dissipa a ansiedade ao relembrar o Eclesiastes: “Tudo tem o seu tempo determinado, e há tempo para todo o propósito debaixo do céu. Há tempo de nascer, e tempo de morrer; tempo de plantar, e tempo de arrancar o que se plantou... Tempo de chorar, e tempo de sorrir; tempo de prantear, e tempo de dançar...”
É dezembro outra vez. Assim Seja!
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Timbaúba-PE, 1º/12/2012
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DEIXANDO QUE SURJA O DIA
Daslan Melo Lima
Seria amor, paixão, atração? Não! Definitivamente,não! Imaturidade, fuga, ilusão? Sim! Definitivamente, sim! Apenas o Eu verdadeiro adormecido não se dava conta de que o espelho refletia uma fantasia. Foi quando registrei num caderno os meus sentimentos, codificados, misteriosos, nebulosos. Foi quando escrevi um poema chamado “Verdade”.
Há uma palavra que falta ser dita / Há um sorriso que falta ser expressado / Ainda se faz noite / Deixemos que surja o dia. /// Quando surgir o dia / e o sorriso for expressado / talvez o sol se esconda / e continue a chover. /// Por hoje há só noite / deixemos que surja o dia.
Depois de muito silêncio, a palavra foi dita. Depois de muitas lágrimas, o sorriso foi expressado. O dia surgiu. O sol apareceu.
De vez em quando, o Daslan de um tempo que se foi enfrenta um vendaval composto de amor, paixão, atração, imaturidade, fuga e ilusão. Como estou mais sábio, fico silenciosamente comigo, apenas comigo, tal como nesta noite, aguardando a calmaria, deixando que surja o dia.
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Timbaúba-PE, na última noite de novembro de 2012.
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AQUELA AJUDA DISCRETA, AQUELA RESERVA DE AMOR
A empresária Solange Barros, natural de Limoeiro-PE, e radicada há anos em Timbaúba, construiu ao lado do esposo Flávio uma linda e sólida família a quem DEUS presenteou com três frutos: Cássio, Victor e Mirella. ***** A capa de PASSARELA CULTURAL desta semana rende tributo ao amor e à cumplicidade existente entre as mães e as filhas através da imagem de Solange e Mirella e de “Minha Filha”, poema de Ivone Boechat:
“Tanta ternura / guardada, acumulada, / na alegria, / na dor, / 24 horas e sempre / para o amor. / Uma filha é assim: / certeza de amparo, / de socorro, / de favor, / silenciosamente confiável. / Filha é aquele ombro amigo, / aquela ajuda discreta, aquela reserva de amor.”
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Timbaúba-PE, 17/11/2012.
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"SEMPRE IMAGINEI QUE O PARAÍSO FOSSE UMA ESPÉCIE DE LIVROS"
Daslan Melo Lima
"Sempre imaginei que o paraíso fosse uma espécie de livros", disse um dia Jorge Luiz Borges (1899-1986), poeta e escritor argentino.
O espaço generoso da Livraria Cultura no Shopping RioMar é um paraíso. Nada mais emblemático do que a imensa escultura de madeira pendurada no teto, representando um dinossauro.
Em PASSARELA CULTURAL, como sempre, falo de sentimentos, cultura, beleza... Ouso dizer que este blog é uma revista on-line semanal, quase um livro virtual. E se ao visitá-lo você se sente bem, talvez eu esteja semeando por aqui um pouco do paraíso.
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Timbaúba-PE, 17/11/2012
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ESSE CARA É ELE
Daslan Melo Lima
Se a história da minha vida fosse transformada em filme ou novela, a maioria das canções gravadas por Roberto Carlos ocuparia a maior parte da trilha sonora. Desde a minha adolescência que as músicas cantadas por ele, tanto as de sua autoria em parceria com Erasmo Carlos, como as compostas por outros autores, vem marcando muitas fases da minha caminhada.
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Quando as primeiras paixões platônicas começaram a me banhar de ilusão, os rádios tocavam "Meu Grande Bem". "Quem ouvir esta canção, / com certeza vai pensar,/ que eu tenho um coração / guardadinho pra rifar. / Tenho quase um harém / e a todas quero amar,/ pode ser você, meu grande bem. / Gosto do A. / Gosto do C. / Gosto do M e do L também. / Se seu nome aqui está, / não espere venha já, / pode ser você meu grande bem."
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Quando crises de desamor feriram minh’alma, senti-me confortado com “Detalhes”. "Não adianta nem tentar me esquecer / Durante muito tempo em sua vida eu vou viver./ Detalhes tão pequenos de nós dois / são coisas muito grande pra esquecer / e a toda hora vão estar presentes você vai ver."
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Em várias situações, não rezei, cantei “A Montanha”. "Eu vou seguir uma luz no lá no alto, / eu vou ouvir uma voz que me chama, / eu vou subir a montanha e ficar bem mais perto de Deus e rezar.../ Por mais que eu sofra, obrigado, Senhor, mesmo que eu chore. / Obrigado,Senhor, por eu saber / que tudo isso me mostra o caminho que leva a Você..."
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E eis que agora, a música mais tocada em todo o Brasil, "Esse cara sou eu", diz o que eu tantas vezes gostaria de ter dito a certo alguém : "O cara que pensa em você toda hora / Que conta os segundos se você demora / Que está todo o tempo querendo te ver... / Esse cara sou eu / O cara que ama você do seu jeito... / Te fala outras coisas... / O cara que sempre te espera sorrindo.../ Esse cara sou eu...”
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Se a história da minha geração fosse transformada em filme ou novela, a maioria das canções gravadas por ele, pelo "cara" Roberto Carlos, ocuparia a maior parte da trilha sonora.
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Timbaúba-PE, 17/11/2012
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CHEIRO DE EMOÇÕES INACABADAS
Daslan Melo Lima
Uma chuva abençoada caiu sobre Timbaúba na quinta-feira. Um cheiro gostoso de terra molhada se espalhou de norte a sul, de Mocós à Timbaubinha. Uma bênção para exorcizar o calor insuportável que estava fazendo. Parecia um sonho! Fui ao Facebook e compartilhei com meus amigos a minha satisfação. Vários responderam dizendo que adoravam cheiro de terra molhada, enquanto dois comentários de duas amigas calaram fundo na minh’alma.
Isabel Tereza disse: “Cheiro de infância, a terra molhada... Lembro de tomar banho nas bicas da rua inteira, pisar com força nas poças d'agua, abrir a boca para engolir os pingos, e pedindo ao céu para a chuvinha não afinar. Depois ouvia a voz pesada da minha mãe: - Pra dentro que se demorar mais vai adoecer!” Lucimere Andrade disse: “Adoro a chuva! Me lembra a infância. Aproveitava para fazer barquinho de papel e vê-lo ir embora.”
Sei bem o que são esses sentimentos que a chuva evoca. Quando chove, o menino que eu fui se permite ficar sob a chuva, engolir pingos d'água e pisar com força nas poças. Mas uma coisa machuca meu coração e minhas lágrimas se confundem com a chuva. Não ouço mais minha mãe gritando: "Pra dentro, agora! Você vai adoecer!"
Embora não soubesse fazer barquinhos de papel, pedia um deles a um colega e soltava na correnteza que se formava no meio-fio da calçada. Ainda sei na ponta da língua, um soneto do poeta Guilherme de Almeida (1890-1969), decorado na adolescência:
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Quando a chuva cessava e um vento fino / franzia a tarde tímida e lavada, / eu saía a brincar, pela calçada, / nos meus tempos felizes de menino.
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Fazia, de papel, toda uma armada; / e, estendendo meu braço pequenino, / eu soltava os barquinhos, sem destino, / ao longo das sarjetas, na enxurrada...
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Fiquei moço. E hoje sei, pensando neles, / que não são barcos de ouro os meus ideais: /são feitos de papel, são como aqueles,
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perfeitamente, exatamente iguais... / - Que os meus barquinhos, lá se foram eles! / Foram-se embora e não voltaram mais!
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Cheiro de chuva, cheiro de terra molhada, cheiro de emoções inacabadas.
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Timbaúba-PE, 10/11/2012.
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LICENÇA PARA SONHAR
Daslan Melo Lima
Eu nunca fui uma pessoa prática, objetiva, dotada de raciocínio rápido. Sempre necessitei ter mais um pouco de tempo para me situar diante de algumas circunstâncias. Sei que a vida em muitas ocasiões requer que sejamos rápidos, mas durante minha caminhada vi muita gente se dar mal exatamente por não ter se permitido parar e refletir melhor antes de agir.
Relendo Fernando Pessoa (1888-1935), poeta e ensaísta português, mergulhei neste texto: “A superioridade do sonhador consiste em que sonhar é muito mais prático que viver, e em que o sonhador extrai da vida um prazer muito mais vasto e muito mais variado do que o homem de ação. Em melhores e mais diretas palavras, o sonhador é que é o homem de ação.”
No passado, em alguns momentos de minha vida profissional, fui penalizado por agir menos e sonhar mais. Mas lá na frente, graças a DEUS, eu fui premiado exatamente por ter sonhado mais e agido menos. E agora, com licença, sou um homem de ação, vou sonhar.
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Timbaúba-PE, 10/11/
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EU E A LUA
Daslan Melo Lima
Apaixonei-me em criança por ela, a Lua, linda, majestosa, enfeitando o céu de São José da Laje e iluminando de prata as pedras cinzas do Rio Canhoto. No meu tempo de menino, a energia elétrica era precária no interior de Alagoas. As lâmpadas pareciam duas brasas prestes a se apagar. Sem televisão, sem internet, sem computador, tudo em volta era um convite para o recolhimento, conversas nas calçadas, adultos contando histórias de trancoso, pessoas lendo folhetos de cordel sob a luz de candeeiros, crianças brincando de roda...
Nas noites enluaradas, a Lua era a deusa das ruas e levava meu coração e minh’alma para um território imaginário de mágicas ilusões onde todos os meus sonhos aconteciam.
Na quinta-feira, 25, quando do apagão que atingiu o norte e nordeste, fui para o quintal da minha casa conversar com a Lua, enquanto lá fora um silêncio amigo, sábio, conveniente e oportuno inundava a rua.
Por alguns minutos, enquanto fotografava minha paixão antiga, tive a impressão de ouvir o vento repreender o menino que um dia eu fui por nunca mais ter dado atenção à Lua.
Aprendi uma lição com o apagão. Ele me ensinou que a Lua não mudou nada. Ela continua à minha disposição para levar meu coração e minh’alma para um território imaginário de mágicas ilusões onde ainda há espaço para todos os meus sonhos.
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Timbaúba-PE, 27/10/2012
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UM SÁBADO PARA RECORDAR
Durante a versão timbaubense da festa "Um Sábado em Timbaúba", promovida por Rogério Falcão, na AABB, no dia 29/09/2012, fui homenageado com uma placa com os seguintes dizeres: “Daslan – Fundador do blog PASSARELA CULTURAL que enaltece o nome de Timbaúba e do Grupo Matutos de Timbaúba divulgando todos os eventos sociais e culturais para o Brasil e exterior - Nossa eterna gratidão! – Timbaúba, 29/09/2012 - Rogério Falcão e Grupo Matutos de Timbaúba.”
Na foto ao lado, o Sr. Enicênio, representante do Grupo Matutos de Timbaúba dos Mocós, posa ao meu lado com a placa que me foi concedida. Sensibilizado com a distinção, pronunciei as seguintes palavras:
Sou grato a DEUS pelas circunstâncias da minha caminhada que me conduziram até aqui, pelos momentos doces, amargos e agridoces, pois a vida é feita da mistura de tudo isso. Cheguei a Timbaúba em 1985 para trabalhar no BNB, Banco do Nordeste do Brasil, e fui ficando. Meu coração está dividido entre duas princesas, a pernambucana Timbaúba, Princesa Serrana, e a alagoana São José da Laje, Princesa das Fronteiras.
Há uma relação mística e mágica entre a minha pernambucana terra adotiva e a minha alagoana terra natal. O maior benfeitor de São José da Laje foi o timbaubense Cel. Carlos Lyra, que migrou para Alagoas no início do século passado e lá, na cidade onde nasci, entre outras obras, fundou a Usina Serra Grande e construiu a Igreja Matriz, um dos mais belos templos católicos do Brasil. Em São José da Laje repousam os restos mortais do poeta timbaubense João Pinheiro de Andrade Lyra, neto de Carlos Lyra e sobrinho-neto do jornalista Jader de Andrade, o maior ícone cultural timbaubense. Há uma semelhança entre as topografias de ambas as cidades. Lá, o Rio Canhoto e os morros. Aqui, o Rio Capibaribe-Mirim e os altos.
Muito grato ao Rogério Falcão e ao Grupo Matutos de Timbaúba por esta homenagem. Muito obrigado a todos aqui presentes. Guardarei esta placa no meu coração e no arquivo azul das coisas que me são caras. Divido esta honraria com as pedras do Rio Canhoto de São José da Laje, ouvintes silenciosas das minhas primeiras mágoas, cúmplices dos meus primeiros versos, berço da minha poesia e das minhas crônicas. Também divido esta honraria com todas as pessoas que dão a sua parcela de contribuição para a construção de um mundo melhor, e com o vento que nesta noite fria sopra entre os altos de Timbaúba dos Mocós, Princesa Serrana de todos nós.
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VENTO, ÁGUA E SILÊNCIO
Daslan Melo Lima
Cecília Meireles disse um dia: "Um poeta é sempre irmão do vento e da água: deixa seu ritmo por onde passa".
Eu acrescentaria o silêncio na citação de Cecília Meireles. Dessa forma, a frase ficaria assim: "Um poeta é sempre irmão do vento, da água e do silêncio: deixa seu ritmo por onde passa."
Eu tenho três irmãos fantásticos: o vento, a água e o silêncio. O vento é símbolo do poder divino, criador e vivificador, e lembra o caráter efêmero e frágil da minha condição humana. A água está sempre associada ao nascimento e renascimento. Quanto ao silêncio, ele existia antes da Criação e sobreviverá ao fim dos tempos.
Como eu adoraria poder me alimentar apenas nestas três fontes: vento, água e silêncio. Como eu adoraria compartilhar com todos os meus companheiros de caminhada, passageiros desta estação Planeta Terra, estas três fontes que nesta madrugada me alimentam: vento, água e silêncio.
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Timbaúba-PE, na madrugada do penúltimo domingo de outubro de 2012.
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MINHA CANÇÃO DE OUTUBRO
Daslan Melo Lima
Aqui estou para louvar o décimo mês do ano, um mês muito especial para mim, pois foi na tarde de um 17 de outubro que nasci. Durante muito tempo, a minha relação com outubro foi marcada por conflitos. Envolvido com os mistérios da vida e da morte e com mil perguntas sem respostas, eu não via sentido celebrar aniversário. Mudei com o tempo, graças a DEUS, para surpresa, alegria e felicidade do menino introspectivo que sempre fui.
E porque é outubro, volto a cantar a canção que fiz em parceria com alguns anjos invisíveis, o silêncio e o vento.
MINHA CANÇÃO DE OUTUBRO
Daslan Melo Lima
Seja bem-vindo, meu amado mês de outubro.
Pode contar meus desamores e desilusões.
Com o silêncio e o vento, aprendi a lhe amar,
mesmo com a ausência de amores e ilusões.
Seja bem-vindo, meu amado mês de outubro.
Foi com você que vim cunprir uma jornada.
Atravessei tempestades, sonhos e pesadelos,
até amadurecer com as lições da caminhada.
Seja bem-vindo, meu amado mês de outubro.
Há fé em minhas mãos de esperança.
Ajuda-me a espalhar sabedoria ao nosso redor,
até que o abismo seja diluído em lembrança.
Seja bem-vindo, meu amado mês de outubro.
Por um mundo melhor colabora o meu coração.
E Deus colocou este sorriso no meu rosto
para com harmonia cantar esta canção.
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Timbaúba-PE, 13/10/2012
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DIA E NOITE, NOITE E DIA
Daslan Melo Lima
Se uma vida a dois fosse só poesia, era comigo que tu estarias, dia e noite, noite e dia.
Quando fossemos acordados pela manhã ensolarada, em parceria com os raios de sol comporíamos uma canção. Quando fossemos surpreendidos pela noite chuvosa, em parceria com os pingos da chuva comporíamos uma oração.
Se uma vida a dois fosse só poesia, era comigo que tu estarias, dia e noite, noite e dia.
E quando chegasse o natal, a criança que existe em mim dançaria pastoril com a criança que existe em ti. E quando chegasse o carnaval, a extroversão adormecida em mim dançaria frevo com a extroversão que habita em ti.
Se uma vida a dois fosse só poesia, era comigo que tu estarias, dia e noite, noite e dia.
De outra realidade, todavia, é feita a minha vida, a tua vida, as manhãs, as noites, o natal e o carnaval. E cada um em sua caminhada tem de administrar a fantasia.
Se uma vida a dois fosse só poesia, eu e tu juntos estaríamos, dia e noite, noite e dia.
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Timbaúba-PE, 29/09/2012
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VOANDO NOS BARCOS
Daslan Melo Lima
Um amigo compartilhou em minha página no Facebook uma imagem nostálgica que me levou a um tempo mágico onde minha imaginação tinha mais asas do que hoje. Trata-se de uma foto com aqueles brinquedos que na minha infância alagoana o pessoal chamava “barcos”.
Eu ficava observando os garotos e garotas se divertindo e admirava a coragem de quem tinha coragem de nos "barcos" entrar e praticamente voar. Tentei uma vez disfarçar meu medo, mas não houve jeito. Em um deles sentei, mas logo me levantei.
Há uma pendência emocional em minha vida. Nunca fui um daqueles meninos que nos "barcos" voava. Tento me conformar por imaginar que nenhum deles chegava ao ponto em que eu chegava na minha fantasia de criança. Mesmo sem voar nos barcos, eu atingia as estrelas, eles não.
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Timbaúba-PE, 21/09/2012.
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EM NOME DAQUELE RETIRO E DAQUELE CARNAVAL DE 1943
Daslan Melo Lima
Um dos meus programas culturais preferidos é visitar os “sebos” do centro do Recife, onde encontro ótimos livros antigos. Sempre compro algum, às vezes vários, quase sempre livros dos quais nunca ou pouco ouvi falar, mas que têm muito a me ensinar. Adoro quando encontro entre suas páginas anotações dos seus antigos donos que me provocam muitas indagações e inspirações.
Comprei ontem o livro À Procura do Senhor, de Ludovic Giraud, edição de 1953 da Livraria Agir Editora, onde encontrei uma foto de Santa Teresinha do Menino Jesus em cujo verso, imagem à esquerda, estava impresso:
"Quem quiser ser amigo do mundo constitue-se inimigo de Deus " Tg. 4,4. _____ LEMBRANÇA do retiro e Páschoa das Moças no carnaval de 1943, pregado pelo Pe, José Pereira Neto, no colégio Nossa Senhora do Carmo, paróquia de Nova Cruz. ____ “Espírito Divino, regai o que em mim é árido, curai o que é enfermo”.
Fecho os olhos e fico a imaginar quem seriam aquelas moças católicas que preferiram um retiro ao carnaval. Vou ao Google pesquisar sobre a folia de um ano em que eu ainda não tinha nascido e descubro a poesia de Hermes Fontes (1888-1930). A adaptação do seu poema Luar de Paquetá, com música de Freire Junior (1881-1956), gravado em ritmo de marcha-rancho, foi o grande sucesso do carnaval de 1943, nas vozes de Dircinha Batista (1922-1999) e Deo (1914-1971), imagem à direita. O poema é este:
Nestas noites olorosas / Quando o mar, desfeito em rosas, / Se desfolha à lua cheia / Lembra a ilha um ninho oculto / Onde o amor celebra em culto / Todo encanto que o rodeia / Nos canteiros ondulantes / As nereidas incessantes / Abrem lírios ao luar / A água em prece borborinha / E em redor da capelinha / vai rezando o verbo amar. /////
Jardim de afetos / Pombal de amores / Humildes tetos / De pescadores / Se a lua brilha / Que bem nos dá / Amar na ilha / de Paquetá /////
Pensamento de quem ama, / Hóstia azul, fervendo em chama,/ Entre lábios separados.../ Pensamento de quem ama / Leva o meu radiograma / Ao jardim dos namorados / Onde é esse paraíso / O caminho que idealizo / Na ascensão para esse altar / Paquetá é um céu profundo / Que começa neste mundo / Mas não sabe onde acabar... /////
Sobre o mar de azul rendado, / Que é toalha de um noivado / Surge a ilha - taça erguida. / E o luar - vinho dourado / Enche a taça do passado / Que embriaga a nossa vida! / Ai, que filtro milagroso, / Para a mágoa e para o gozo / Para a eterna inspiração! / O luar, na mocidade, / Abre as rosas da saudade / Dentro em nosso coração.
Diante da poesia de Hermes Fontes, eu fico a perguntar: Será que aquelas moças não poderiam conciliar o retiro, a fé e a religião com o carnaval? Parece que ouço vozes invisíveis ao meu lado dizendo que Sim. Acessamos o Yotubbe , http://www.youtube.com/watch?v=5tiL6e3g9SY . Uma doce e mística nostalgia se derrama na tarde timbaubense, e em nome daquele retiro e daquele carnaval de 1943 cantamos juntos Luar de Paquetá.
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Timbaúba-PE, 15/09/2012.
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JOÃO E MARIA,
O QUE É QUE A VIDA VAI FAZER DE MIM?
Daslan Melo Lima
Preciso trazer mais para perto de mim a criança que um dia eu fui, a fim de entender melhor a sutileza de certas coisas lindas, tais como a valsa “João e Maria”, de Sivuca (1930-2006) e Chico Buarque de Holanda.
Agora eu era o herói e o meu cavalo só falava inglês
A noiva do cowboy era você além das outras três
Eu enfrentava os batalhões, os alemães e seus canhões
Guardava o meu bodoque e ensaiava o rock para as matinês
Nas sessões da tarde do único cinema da cidade onde nasci, os cowboys americanos pareciam voar em cima dos seus cavalos.Eu ficava tão concentrado que de repente quase que eu não era eu, era Rocky Lane, Roy Rogers, Rex Allen...
Agora eu era o rei, era o bedel e era também juiz
E pela minha lei, a gente era obrigado a ser feliz
E você era a princesa que eu fiz coroar e era tão linda de se admirar
Que andava nua pelo meu país
Não havia televisão. A iluminação pública era muito fraca e as lâmpadas nos postes pareciam duas brasas prestes a se apagar. Todos dormiam mais cedo e a felicidade parecia ser uma coisa não muito distante.
Não, não fuja não, finja que agora eu era o seu brinquedo
Eu era o seu pião, o seu bicho preferido
Vem, me dê a mão, a gente agora já não tinha medo
No tempo da maldade acho que a gente nem tinha nascido
As crianças brincavam de roda e a maldade era coisa para quem já tinha 18 anos de idade e podia assistir aos filmes de Brigitte Bardot.
Agora era fatal que o faz-de-conta terminasse assim
Pra lá deste quintal era uma noite que não tem mais fim
Pois você sumiu no mundo sem me avisar
E agora eu era um louco a perguntar
O que é que a vida vai fazer de mim?
Trago sempre para perto de mim o menino alagoano de São José da Laje que um dia eu fui, a fim de exercitar a humildade na minha caminhada. É ele que faz o vento semear fé e esperança em minh'alma quando o homem que sou ainda pergunta: O que é que a vida vai fazer de mim?
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Timbaúba-PE, 08/09/2012
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Uma das melhores interpretações de "João e Maria" é a de Glória Pires e Lauro Corona (19571989), exibida no Fantástico, na TV Globo, em 1978, na época em que os dois atores faziam sucesso como par romântico na novela Dancin Days, de Gilberto Braga. Vale a pena conferir, http://www.youtube.com/watch?v=3rgzivEjPZU&feature=related
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TODOS OS SÁBADOS DE PRESENTE
Daslan Melo Lima
Foi numa manhã de sábado como esta que me dei alta de cinco anos de terapia. Quando algo em minh’alma, mais forte do que o meu coração, entendeu que eu estava pronto para caminhar convivendo com os mistérios da vida e da morte, senti-me maduro para administrar minhas ilusões e desilusões, meus sonhos e pesadelos... No início da sessão, quando o terapeuta perguntou-me como eu estava , dei minha resposta em forma de poesia:
Estou emergindo de intensos conflitos em meu coração. Nos mergulhos intensos eu me despedacei. Pedaços juntei, desencantei, encantei. Agora eu quero urgente todos os sábados de presente. Que venham com contrastes, trazendo amores e desamores. Corpo e alma libertos estarão abertos para beijar os amores, para entender os desamores. Vou me dar urgente todos os sábados (e todos os dias) de presente.
Depois de tantos sábados que já me dei de presente, o menino que um dia eu fui às vezes sente-se frágil diante de fantasmas que tentam povoar os meus dias. Mas quando isso acontece, fecho os olhos, respiro fundo, ouço o silêncio e ao lado do vento aplaudo a harmonia que hoje existe entre os meus anjos e os meus demônios.
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Timbaúba-PE, 1º/09/2012.
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A GALERIA DO AMOR
Daslan Melo Lima
Outro dia, um amigo muito querido postou na sua página no Facebook um vídeo do Youtube onde Agnaldo Timóteo canta A Galeria do Amor, uma das minhas canções românticas preferidas, composta pelo próprio Agnaldo, inspirada num passeio que o cantor fez há alguns anos pela Galeria Alaska, famoso ponto de encontro carioca de garotos e garotas de programa. As palavras carência, amor, paixão, sexo, atração, solidão, amor, desamor, ilusão e desilusão caminham juntas. Elas se entrelaçam e cada uma tem o seu impacto emocional. Pelo drama que a letra da música do Agnaldo Timóteo expõe, talvez o título mais adequado para ela fosse A Galeria das Ilusões, porque Amor, na verdadeira acepção da palavra, é outra coisa.
Numa noite de insônia saí / procurando emoções diferentes. / E depois de algum tempo parei, / curioso por certo ambiente. / Onde muitos tentavam encontrar / o amor numa troca de olhar.///
Na galeria do amor é assim, / muita gente a procura de gente. / A galeria do amor é assim, / um lugar de emoções diferentes, / onde gente que é gente se entende, / onde pode se amar livremente. ///
Numa noite de insônia saí / e encontrei o lugar que buscava. / A galeria do amor me acolheu, / bem melhor do eu mesmo esperava. / Hoje eu tenho pra onde fugir / quando a insônia se apossa de mim. ///
Na galeria do amor é assim, / muita gente a procura de gente. / A galeria do amor é assim, / um lugar de emoções diferentes,/ onde gente que é gente se entende. / onde pode se amar livremente. / Onde gente que é gente se entende. / Onde pode se amar livremente.
Galeria do Amor ou das ilusões, pouco importa, pois considero essa música do Agnaldo Timóteo um grito diante da solidão, da carência, do desamor... “Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é”, diz um trecho da música Dom de Iludir, do Caetano Veloso. “Cada um sabe a dor e a delícia de ser o qué é”, repetem comigo o silêncio, o vento, o frio e a chuva deste último sábado de agosto de 2012.
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JEAN BOGHICI E O GATO QUE MORREU
Daslan Melo Lima
Na segunda-feira, 13, em torno das 18 horas, um incêndio no apartamento de Jean Boghici, 84 anos, romeno radicado no Brasil desde 1949, um dos maiores colecionadores de arte do país, destruiu parte do acervo do seu apartamento no Rio de Janeiro, Ele sofreu uma perda incalculável, impossível de avaliar em termos financeiros, quando pinturas valiosíssimas como Samba, de Di Cavalcanti, e Floresta Tropical, de Guignard, viraram cinzas.
Ao tomar conhecimento da fatalidade, Jean Boghici surpreendeu a todos ao dizer repetidas vezes, e com a voz embargada, que a maior perda não foi os quadros valiosos de sua coleção, mas a morte da sua gata Pretinha, que morreu atingida pelas chamas. Ele disse chorando: "Estou muito chateado, mas não é por causa do quadro não. É por causa do meu gato, que morreu. Ficava ao lado da minha cama; isso é o que me dói. Não quero saber de quadro, meu gato morreu". Depois, demonstrando uma força fantástica diante da adversidade, disse que ia se vingar do acidente fazendo uma bela exposição: "Queimou, qual o problema? Vai ficar tudo bom de novo. Já tive esse problema na década de 1970, perdi vários quadros e fiquei doente praticamente. Na época, fiz uma bela exposição e foi uma vingança contra o destino. Vamos fazer exposição muito bonita para me vingar."
Neste agosto, o mês que, infelizmente rima com desgosto, devido à fama que tem de azarado, vai ficar o exemplo de humildade, humanidade e despojamento de Jean Boghici. Vai ficar o seu exemplo de resignação e otimismo.Vai ficar a sua declaração emocionante: "Estou muito chateado, mas não é por causa do quadro não. É por causa do meu gato, que morreu. Ficava ao lado da minha cama; isso é o que me dói. Não quero saber de quadro, meu gato morreu".
QUANDO SETEMBRO VIER
Daslan Melo Lima
Robert Tablot, proprietário de uma luxuosa vila italiana, passa o ano todo fora do país e só retorna nos meses de setembro. Quando ele aparece de surpresa, em pleno mês de julho, fica surpreendido com uma série de situações inusitadas. Lisa, sua namorada, cansada de esperar por ele, está de casamento marcado com outro. Enquanto isso, o administrador da sua propriedade alugou o imóvel para hospedar um grupo de garotas americanas, entre elas Sandy , adolescente sonhadora paquerada por Tony. Eis aí o fio condutor de “Quando Setembro Vier” (Come September), de Roberto Mulligan (1925-2008), deliciosa comédia romântica dos anos 60 protagonizada por quatro ídolos inesquecíveis da minha geração, Bobby Darin (1936-1973), Gina Lollobrigida, Rock Hudson (1925-1985) e Sandra Dee (1942-2005).
Gosto da sonoridade do nome do nono mês do ano, se-tem-bro. O vento e o silêncio são testemunhas de que sou vítima de um mal incurável, progressivo e irreversível: sofro de romantismo. Adoro rever “Quando Setembro Vier”, antes de setembro chegar. Revejo meus ídolos, lindos e cheios de vida, crio coragem e “viajo” com eles de lambreta através de lindas paisagens italianas. Sou um dos amigos de Bobby Darin e danço com a turma quando ele canta “Multiplication” (vide http://www.youtube.com/watch?v=YwRKzIXdVLc&feature=related).
Por pouco não saio do corpo para ficar no filme, para sempre, mas o tempo e a realidade me chamam. Preciso estar com minhas emoções sob controle, quando setembro vier.
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Timbaúba-PE, 11 de agosto de 2012, faltando dois sábados para setembro chegar.
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É AGOSTO OUTRA VEZ
Daslan Melo Lima
Fatalidades e tragédias acontecem em qualquer mês do ano, mas é Agosto que leva a fama de azarado. Diz uma lenda que no oitavo mês do ano um dragão imenso passava pelo céu cuspindo fogo assustando as pessoas. Quanto ao fato deste mês ser conhecido como “o mês do cachorro louco”, o que acontece é que as cadelas entram no cio duas vezes por ano, uma delas em Agosto, quando os machos ficam enlouquecidos na disputa da atenção das fêmeas. Os cães brigam entre eles e o contato favorece a disseminação do vírus da raiva, doença infecciosa transmitida pela saliva do animal.
Porque é Agosto, em Timbaúba reina um friozinho gostoso e ventos generosos contornam os morros fazendo a festa da garotada que solta pipas. É uma pena que Agosto seja um nome que, infelizmente, rima com desgosto.
Porque sou um homem de muita fé em DEUS, não tenho receio algum de Agosto. Sereno e otimista, visto um casaco de frio na tarde que morre (e na noite que nasce) e saio para minha caminhada com meu cachorro cantarolando em silêncio uma velha canção gravada por Fernando Mendes.
Não adianta um pé de coelho no bolso traseiro, / nem mesmo a tal ferradura suspensa atrás da porta, / ou um astral bem maior que o da noite passada, / pois toda sorte tem quem acredita nela. ///// Não é preciso dizer que dará recompensa. / Não faça isso há muitos que gostam de criticar. / Esperam a sorte sentados sem sair do lugar, / mas toda sorte tem quem acredita nela. ///// Não adianta ir à igreja rezar e fazer tudo errado. / Você quer a frente das coisas olhando de lado. / O céu que te cobre não cobra a luz da manhã. / Desperte pra vida, acredite, a sorte é irmã.
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Timbaúba-PE, na tarde do terceiro dia de agosto de 2012.
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A POMBA E O CLIQUE
SUÍTE PARA O FINAL DE MARÇO