A edição da revista Joyce Pascowitch de agosto 2015 dedicou seis páginas a uma das maiores referências
de glamour da história brasileira, a Casa Canadá. A reportagem, que tem a assinatura do jornalista Renato Fernandes,
contou com algumas informações prestadas por mim, com base no meu acervo de publicações que marcaram epóca na imprensa do nosso País, O Cruzeiro e
Manchete. Abaixo, transcrevo a reportagem na íntegra, como um documento precioso
de um tempo que se foi, com o meu abraço a você, leitor, leitora, e os meus votos de um setembro iluminado, poeticamente e espiritualmente iluminado. - Daslan Melo
Lima.
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CERTINHAS PERO NO MUCHO
Por Renato Fernandes
(Getty Images)
Concentração do high society
carioca nas décadas de 1950 e 1960, a Casa Canadá era um dos locais preferidos
para locomotivas gastarem fortunas em modelitos. Os desfiles eram feitos por
manequins que marcaram época, frequentaram os grandes salões, figuraram em colunas sociais e até mesmo
arrumaram um “bom partido”.
Nos anos dourados, tendo o Rio de
Janeiro como berço, a Casa Canadá de Luxe era o endereço certo para senhoras da
alta sociedade carioca – e do resto do Brasil – comprarem. Situada na avenida
Rio Branco, a butique funcionava sob o comando de Mena Fiala e de sua irmã
Cândida, que fazia as compras em Paris até cinco vezes por ano. “Quando eu
recebia um convite para uma festa, na mesma tarde já saía correndo para comprar
um vestido novo. Era assim com todo mundo: para cada jantar, uma roupa. A Casa
Canadá de Luxe era uma delícia”, conta Martha Rocha em sua biografia. Os
desfiles realizados por lá geravam congestionamento de Cadillac rabo de peixe.
Também consolidaram a profissão de manequim, procuradas por anúncios em
jornais. Para isso eram necessários: beleza, elã, cinturinha 58 cm e, no
mínimo, 1,70 metro de altura.
Em 17 de junho de 1945 aconteceu o
primeiro desfile. As modelos eram contratadas e exclusivas: “Entravam às 9h e
só saíam às 17h. Tinham de estar sempre prontas para desfilar caso chegasse um
cliente”, revelou Mena Fiala à revista Manchete em 1988. “Era Mena quem
selecionava e ensinava as manequins a desfilarem, em estilo francês. Nessa
época, os desfiles eram muito intimistas, com locutor e normalmente sem
passarela”, diz Manoel Borrelli, dono da agência BRM Models. “A importância que
representava para uma manequim ser contratada pela Canadá de Luxe era a certeza
de arranjar um casamento”, afirmou o jornalista Tarlis Batista na Manchete. As
manequins da Canadá de Luxe tiveram uma legião de fãs e admiradores secretos.
Em seus desfiles regados a petit fours era possível ver o escritor José Lins do
Rego, o jornalista Antônio Maria e a primeira dama Sarah Kubitschek. Algumas
conquistaram seus milionários, mas, para outras, o trabalho servia para pagar as
contas e dar um salto maior na carreira. Ser manequim da maison era sinônimo de
glamour e luxo – para poucas.
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A atriz Ilka Soares na Casa Canadá de Luxe. ( Arquivo
Pessoal publicado no livro “A Bela da Tela”)
Ilka Soares, a bela
Diferente das demais, quando Ilka Soares começou a desfilar
na Canadá de Luxe, seu nome já era um sucesso no cinema nacional – embora
estivesse naquele momento sem convites para atuar. Exatamente por isso, Ilka
não teve dúvidas e se candidatou para ser manequim da maison. Magra e um dos
mais belos rostos do nosso cinema, foi contratada na hora e desfilou por anos.
“Aprendi o ofício de manequim também por pura intuição, esforço e disciplina”,
conta em sua biografia “A Bela da Tela”, de Wagner De Assis. Como modelo da
Canadá, passou a ser convidada para frequentar os salões do high. “Comecei a
adorar aquela história de ir ao Country Club, conhecer pessoas interessantes.
Muitas eram riquíssimas, esse mundo de luxo é atraente. Sempre tinha um
namorico aqui ou ali, mas nada de muito sério”, conclui. Em 1958, a bela
protagonizou um romance de mentirinha para a imprensa quando o ator Rock
Hudson, um dos maiores galãs de Hollywood na época, veio passar um Carnaval no
Brasil. Foram a muitos bailes do Municipal e do Hotel Gloria abraçados,
sorrindo e mais nada. Rock era homossexual e, naqueles tempos, assumir, nem
pensar: tinha de disfarçar.
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A manequim Adalgisa Colombo em pose na Casa Canadá. (Revista Manchete)
Adalgisa Colombo, a chic
Os desfiles na Casa Canadá serviram e muito para Adalgisa
Colombo ganhar o concurso de Miss Brasil 1958 e ainda ser nossa vice-Miss
Universo. Na primeira noite que desfilou no Maracanãzinho como concorrente de
Miss Distrito Federal, tinha todo apoio de dona Mena Fiala, e veio clássica.
Nada de cabelos soltos como toda miss costuma até hoje desfilar nas passarelas.
Adalgisa surgiu com os cabelos presos, altiva e desfilando como se estivesse na
maison. Não era a preferida do público – até então, Ivone Richter, Miss
Riachuelo, era a mais aplaudida. “Mena Fiala uma vez declarou: ‘Você tem tudo
para ser uma manequim famosa, minha filha. Tem altura, silhueta, estampa… Só
não tem idade. Não se pode ser manequim aos 15 anos. Deixe passar um pouco de
tempo, depois volte’”, diz o “missólogo” Daslan Melo Lima.
A fenomenal Georgia Quental na capa de antigas edições da
extinta revista Manchete, de 1963 e 1964.
Georgia Quental, a temperamental
Bomba no cinema nacional! Em 1963, estreia o filme Boca de
Ouro, de Nelson Pereira dos Santos, baseado na obra de Nelson Rodrigues. De
repente, uma grã-fina chamada Lúcia abre o vestido e mostra seus seios
perfeitos para um bicheiro, interpretado por Jece Valadão. Quem é ela? Georgia
Quental, a fenomenal. “Para mim, ela foi um símbolo da Canadá de Luxe na década
de 1960”, diz Ruy Castro. La Quental também é conhecida por seu temperamento
forte. Fortíssimo. Casar, nunca casou. Filhos, não teve.
Norma Bengell, a rebelde
Foi aos 16 anos, no Copacabana Palace, que Norma Bengell
teve a oportunidade de conhecer Mena Fiala. “Me inscrevi para participar do
desfile da Festa das Rosas. Quem poderia garantir que eu não encontraria ali um
bom homem? Afinal, era um concurso para meninas ricas da sociedade. Eu era a
única pobre”, diz La Bengell em sua biografia. Norma não ganhou o concurso,
ficou em segundo lugar, mas, sem querer mais passar perrengue com a mãe
desquitada, foi pedir emprego para Mena, que a aceitou. Norma largou os estudos
e passou a trabalhar diariamente como manequim do ateliê. “Os vestidos eram
feitos sobre o meu corpo e me espetavam com alfinetes para ajustá-los. Quando
chegava uma cliente, eu desfilava o modelo para ela decidir se comprava ou não.
Tinha 1,72 metro, mas como era jovem demais e estava um pouco acima do peso,
não servia para manequim destacada”, revelou na biografia. Mais rechonchuda,
acabou virando manequim de roupas esportivas. Ficava o tempo inteiro em pé e
passava o dia com fome. “Era entediante. O sonho de ser manequim estava
realizado, mas não era aquela maravilha”, conclui.
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