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sábado, 27 de julho de 2019

DE OLHO NO PASSADO - Sebastião Vila Nova, "Passarinho, pé de alfinete e azul do céu"

Daslan Melo Lima

       Folheando alguns álbuns de recortes nos últimos dias chuvosos, encontrei uma bela crônica de Sebastião Vila Nova (1944-2018) publicada no Diario de Pernambuco, de 22/10/1986. O famoso sociólogo foi meu professor no curso de Ciências Jurídicas e Sociais da Universidade Católica de Pernambuco.  


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Passarinho, pé de alfinete e azul do céu

        Fiz meu amigo um passarinho que mora próximo à janela do meu quarto. Não sabe ele que é meu amigo. Mas, mesmo assim, o é. Pousa diariamente no pé de alfinete da janela e, ali, tira alguma coisa de que necessita. Outras vezes, pude observar mais tarde, pousa na planta só por pousar, e ali fica imóvel, em completa união com a natureza. Passarinho, céu azul e pé de alfinete me fazem feliz, me fazem lembrar da simplicidade natural para que Deus nos fez, me fazem esquecer as mil complicações que inventamos para deteriorar a nossa existência e a de outros seres à nossa volta - os passarinhos, inclusive. Me fazem lembrar vagamente de uma máxima evangélica que fala de lírios e de passarinhos. Me fazem lembrar de Deus.  
        Deixei de lado, por ora, os livros. A eles muito devo. Graças ao que neles aprendi é que sobrevivo e dou de comer, morar e vestir à família. Livros são amigos que a gente faz pela vida afora. Mas com eles acontece o mesmo que acontece com as amizades: não adianta forçá-las. Como as pessoas, os livros têm seu momento para aparecerem em nossa existência. Do mesmo modo que acontece com as pessoas, às vezes você convive anos e anos com um deles para, um belo dia, descobrir o quanto ele é importante para você, para a sua vida. Forçar não adianta. Os livros, como as pessoas, só entram na sua vida no momento certo: o que os fados quiserem.  
        Em vão, contudo, buscar nos livros o que somente a vida pode nos dar. Em vão procurar na palavra impressa a própria voz. Inútil buscar no alheio depoimento a nossa consciência. Inútil procurar no estilo dos outros a sintaxe dos nossos dias. Somos, cada um de nós, o nosso próprio livro. Somos, cada um de nós, o nosso mais importante personagem. Somente nós, condenados a solidão, sabemos das nossas dores, das nossas alegrias, dos nossos êxtases. Hoje, o que me interessa é ler o livro da minha existência, o que não é fácil. 
       Deixo de lado os livros que povoam a minha mente já tão intoxicada de prazeres cerebrais, para conviver com o passarinho da minha janela. O amigo mais simples que me deu a existência. Para ouvir o seu canto, mais um piado, de pássaro dos mais comuns, sem importância para os conhecedores. Por isto é que ele vive e voa livre. Ninguém o quer em nenhuma gaiola. Esta é outra lição que ele me dá: quanto menor a importância que nos concedam maior a nossa liberdade. Quanto menos importante sejamos, ou nos julgamos ser, menor a possibilidade de que nos prendam nas gaiolas do mundo.
        Todas as manhãs, espero pelo amigo passarinho, pelo seu piado de alegria. Nos fins da tarde, olho o pé de alfinete, certo da sua visita. A vida é triste e cinzenta, como os livros que nos distanciam da vida. Mas há um passarinho, um pé de alfinete e um céu de azul  profundo no por do sol. E isto é bom. E basta para me dar paz e acreditar que a vida vale a pena. 
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        Sebastião Vila Nova nasceu em Rio Largo, Alagoas, no dia 18/01/1944, oriundo de uma  família pobre que mudou-se para o Recife quando ele era criança. Chegou a vender cestas de Natal de porta em porta. Graduou-se pelo Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Recife, em 1971Exerceu diversas atividades como professor e diretor de departamento na UFPE e na Universidade Católica de Pernambuco. Foi professor visitante na Universidade Internacional de Lisboa, no mestrado de Ciências Políticas da Universidade Lusófona, também em Lisboa, e no Departamento de Sociologia, da Universidade de Chicago. É autor de diversos livros, entre os quais, Introdução à sociologia, sua obra mais conhecida. Em 2002, recebeu o título de Cidadão Pernambucano. Faleceu no dia 1º/01/2018. 
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Foto: Fundaj
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Fundação Joaquim Nabuco 

Diario de Pernambuco

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